domingo, 19 de dezembro de 2010

Divã II

Minha cólera, minha ira se alastram como com o poder destrutivo de um vulcão. Deixo os destroços das palavras ditas e não ditas, destroços das ações não pensadas e pensadas. E me defronto diante dos destroços. São também fragmentos meus, porque inflo e expando-me, até meu limite máximo, de uma quase fissão nuclear. A impulsividade, a incapacidade de ser coerente, me põe como uma corda entre o abismo e o inferno.
Eu sou meu inferno. Minha consciência é meu inferno dantesco.
Resultado de forjar o que não sou. Das múltiplas facetas e personas que devo representar, perante os outros. Como se não me fosse permitido ser o que sou. As representações me consomem. Subo ao palco das hipocrisias humanas e nele forjo um papel que não consigo interpretar. Uso uma máscara que não me cabe na mente. Odeio a falsidade dos aplausos falsos, das criticas e vaias, quando o papel se corrompe e assume a realidade, que ninguém quer ver.
O palco, o teatro, a trama que se revelam, devem ser a de sempre. Finais felizes!
A tragédia que se subordina ao que é aceito socialmente, ao que é tolerável.
Não é um teatro... É picadeiro de circo que me enoja, porque percebo a estupidez da plateia, que se ri divertida, afinal, representamos bem nosso papel... Então, aplausos para a grande mentira, que conforta e conforma as dores da alma e alimentam as fantasias.

No Divã

Há dias em que sinto que não posso mais.
O amanhecer é meu principal inferno. É nele que me descubro consciente de mim mesma. Carrego em mim dores que não se justificam por si mesmas, são aleatórias e difusas. Não há objetividade e tão pouco, racionalidade para as angústias que me preenchem os poros da alma.
Fumo em demasia, bebo em demasia.. Tudo em mim é o extremo. O extremo da dor, o extremo do medo e o extremo do refúgio que busco e que me é negado pelas exigências que me foram impostas. Assumi, involuntariamente, a missão de viver e viver consiste em algo que perdeu o sentido. Tantos sentidos que busquei construir e nenhum deles me trouxe a significação maior de continuar a existir.
Parece-me um erro viver pelos outros.
Vive-se porque se quer estar vivo, sem esta condição primordial, tudo é vã hipocrisia de um moralismo decadente. A moral que mais parece uma roupa velha, usada e que não nos serve mais. Então por que vesti-la? Estar nu é menos imoral do que forjar uma vestimenta imprópria do qual nos envergonhamos de usá-la em prol de uma coerção social.
Venho perdendo minha lucidez e minha sensatez. Nada que seja rápido, cotidiano, perceptível, mas, em um processo lento e contínuo de mil mortes diárias. Mortes de minhas crenças, das minhas lembranças, do que fui, do que eu era antes da grande queda.
Se, deixei de crer no amor, se deixei de crer na vida em suas significações maiores, é por que em algum momento fui ferida de morte, pela compreensão profunda e maior de que nada faz sentido.
O que me atormenta não é algo que se produz de forma empírica em meu cérebro. Dopam-me, como se isso, resolvesse minha dor de ser. A hipocrisia da ciência, do racionalismo que acredita que a alma não sofre, porque, simplesmente não acreditam em alma.
Mas o que é essa criatura difusa que em mim habita estranha? Uma percepção tão clara e nítida de coisas que não vivi em minha existência atual. Recordações antigas que se perdem em meio a uma nevoa indistinta, mas que no entanto, tem a força de uma existência concreta e tão real, que posso sentir-lhes os cheiros , os aromas e cores.
Vozes que sussurram todos os segredos que não quero ouvir. Essa é a queda que me põe no abismo. Hoje e só por hoje, não desejo nada, além da paz sepulcral dos que jazem no silêncio de uma eternidade vazia.
Descalço meus pés, por que o frio me aproxima do corte de todas as minhas feridas abertas. Não quero o dia de amanhã, não quero o dia de ontem e o dia de hoje, que é a minha única certeza plena, me enoja e me dá asco. Causa-me a dor de todos os poetas mortos. Viver tornou-se uma tortura, para quem deixou de acreditar nos sonhos. Ilusões e sonhos são máscaras que usamos para poder sobreviver. Não quero máscaras, elas me sufocam me trancam a respiração. Só por hoje, forjarei a realidade do nada.
Quinta-feira – 14/10/10

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