sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Heitor.

Lentamente reconstruo minha vida. O pesadelo devastador ainda ronda minhas noites insones. Não acredito na superação da dor. Há dores insuperáveis. Acredito na transformação da dor em algo diverso. Metaforicamente é como a transformação da lagarta em borboleta, onde todo o processo de metamorfose se alimenta de uma cadeia de sucessivas dores e descobertas. Isso é que a natureza nos impõe.
Dentro de mim as mudanças são insignificantes, não amenizam de forma alguma o fardo a qual me submeto diariamente. A dor ainda está aqui, grande, forte, aprisionada como um animal insano que se debate em busca da liberdade que lhe renego. Por vezes, temo que as grades psicológicas que criei, não resistam aos abalos constantes e violentos que este animal me sobrepõe e que me faz despertar de meus devaneios cotidianos.
Tento reconstituir minha história. Imagens e recordações foram de certa forma fragmentadas, em períodos de ausências no qual eu me perco. Tenho destroços de uma vida que tento remendar. Uma ausência presente, que me aperta o peito e faz-me sentir um estranho que habita meu próprio corpo. Uma vaga sensação de despersonalização. Desconheço-me. Tenho lapsos de memória que me angustiam.
Tenho tentado aos poucos retomar minha vida, meu trabalho e estudos. Reconheço minha fragilidade em expor, tocar no assunto que venho tentando sepultar. A companhia dos outros, conseguem em parte, retirar-me dos vácuos e dos abismos que invariavelmente tendo a despencar. Fora do contexto eu diria. Fora do contexto, porem dentro do texto. Parado na inércia do tempo é quase irreal. Pouco importa o que pensam de mim. A cada dia meu desafio consiste em tentar sobreviver.
Agora que olho pela janela da minha sala, tão meticulosamente organizada, vejo que a noite se aproxima lentamente. É neste momento único, quando o por do sol deixa o jardim avermelhado, permito que uma saudade vaga, ofuscada, se insinue por entre as palmeiras do meu jardim e se perca nas avenidas estreitas da minha memória. Inutilmente tento buscar imagens perdidas em um lago escuro demais para qualquer reflexo do que já foi, ou do que é.

“ Tudo está longe demais
parecem até que lustraram um jeito de esquecimento
a sombra confunde a sombra
aprofundando o escuro em seu poço de nunca
tudo está longe demais”
(Henrique do Vale)

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